Já era tarde e ela pensava seriamente a respeito da vida.
E pensar na vida era desatar a pensar no seu futuro. Pensava demais, planejava demais.
Entre os pensamentos já perdidos na imensidão do nada, ela viu aquele rosto. Os olhos que até então repousavam tranquilos, se estatalaram no mesmo instante, se fixaram no teto procurando algo para distrair a mente naquele momento, não queria lembrar daquele rosto.
Mais aos poucos o rosto foi se formando no teto, nas paredes e em tudo que ela olhava.
Há tempos ela não o via. Não pessoalmente pois em pensamentos o rosto dele era uma constante.
Foi se entregando pouco a pouco, sentia o cheiro dele penetrar por todo seu pulmão, sentia uma preguiça gostosa que lhe envolvia a alma. Sentia aqueles olhos fascinantes percorrer todo seu corpo, e ouvir um lindo sorriso dizer: Linda! Amor, você é muito linda!
Ahhhhh! suspirou bem fundo, olhou pro lado e segurou firme as lágrimas, ela não podia chorar por ele. Não queria ter que chorar.
Lá no fundo ela sabia que ainda o amava, para o seu terror aquele amor apenas adormecerá, como um enorme urso no inverno, aquele amor inbernava, porém no seu verão, ele ressurgia mais forte, mais apavorante, chegava e tomava conta de cada canto sombrio de sua vida.
Nessa hora uma lágrima ácida e doída caiu, ela limpou antes que percoresse o seu rosto, mais outras caíram, e se tornaram incontroláveis, assim como aquela chama que ardia dentro do seu peito.
O telefone tocou, ela correu pensando naqueles momentos de filme de amor, esperou ouvir a voz dele, quando ouviu uma grossa voz gritando do outro lado: Pow meo, já é nove horas, vô deixa você pra trás hein menina! e ela, com lágrimas nos olhos, se lembrando da voz do seu outro que era tão terno e sereno, só respondeu: Tô quase pronta amor, tô quase pronta!

- Karol Lombardi