Hoje teve fim a minha servidão aos clássicos padrões de beleza. 
Após anos tentando me encaixar nos moldes impostos pela mídia preconceituosa, decidi me libertar de vez. 
Vou ser sincera, lágrimas quiseram cair ao me encarar no espelho, mas lembrei-me rapidamente da minha resistência, aliás, dos resquícios de resistência da minha raça que eu ainda deixara guardados em mim. Aquela resistência me deu forças para me aceitar e ver o brilho da beleza negra impresso ali, naquele pouco cabelo que havia me restado.
Essas coisas de cabelo são tão complicadas para nós mulheres.
O estereótipo estabelecido pela sociedade é claro, cabelos longos são diretamente ligados a sensualidade feminina, e o cabelo liso, associado ao cabelo bom, cabelo aceitável em qualquer situação. A ditadura do cabelo liso é muito forte entre nós desde criança, é normal que tenhamos em nosso corpo algo que não gostamos, mas pergunte à uma menina negra o que ela mudaria em si mesma, e você ouvirá de 80% delas: MUDARIA O MEU CABELO. Isso é um fato. Triste, mas fato. Muitas vezes nossas mães por terem crescido ouvindo a mesma coisa sobre os nossos cabelos, impunham à nós o mesmo que lhe foi ensinado, querendo nos proteger do preconceito e olhares tortos desde criança.

E todo esse nosso preconceito com o próprio cabelo foi ditado desde muito antes de acharmos nosso cabelo "pixaim", isso veio com o racismo que nos fez achar que tudo que fosse relacionado a nossa raça era feio e inferior comparado aos brancos. Mas se quisermos mesmo entender um pouquinho melhor de onde vem essa história toda, teremos de voltar há mais ou menos dois séculos atrás, (momento nerd) quando a igreja católica (e principalmente os mórmons) criaram uma teoria com alto teor de racismo ao afirmarem que todo o continente Africano e o seu povo era amaldiçoado pois faziam parte da descendência de Cam e assim a maldição do seu pai, Noé, havia se estendido aos descendentes, e por esse motivo, deveriam ser pisados, humilhados e saqueados pelos seus "primos" "superiores e abençoados". Isso é História.
Daí pra frente devido a forte influência da igreja na formação do pensamento fomos bombardeados por História. Nossos gostos, modo de pensar, de classificar as coisas são parcialmente esculpidos e moldados pela História. Quando você pensa em uma favela e remete à negros, isso é História. 
Quando olha uma pessoa com cabelo crespo e o classifica como um cabelo ruim...isso é História. Mas devemos abrir os nossos olhos e enfim aceitarmos a carta de alforria que nos foi dada para escrevermos a nossa própria História.  

Passei por um comprido e angustiante caminho até conseguir cortar  totalmente meu cabelo, aplique, tranças, bigudin (eu conto melhor pra vocês no futuro vlog tá) pensei várias vezes em como seria a aceitação das pessoas, o que pensariam sobre mim...será que eu continuaria bela sem os meus cabelos lisos? 
Mas então decidi que eu teria que aprender a me achar bonita o suficiente para não precisar dos elogios dos outros, eu precisaria começar uma nova história sobre mim mesma.
Depois de tantos anos acordando mais cedo e brigando comigo mesma para fazer escova e chapinha, depois de rios de dinheiros gastos para alisar, hidratar, restaurar, e tantas outras coisas para domar a "juba", decidi que me manter no padrão não valia todos os meus esforços.
Nosso cabelo é a moldura do rosto, e como disse Regina Casé: O brasileiro não tem preconceito, ele tem "preconceito de cabelo". Se você é negra Zulu mas tem o cabelo liso, então tudo bem, você é igual à uma mulher branca. Mas se você é Zulu e tem o cabelo "pixaim", ai você tá na roça".
Pois é, eu achei que ficaria na roça, na roça sem carroça com um cabelo curto com as raízes à mostra, mas sabem o que eu vi quando me encarei no espelho? Bom, vi a minha real e única beleza, solta, leve e toda minha, inteira eu.  Senti um cabelo fofinho e macio, muito diferente das comparações e xingamentos como: Bombril, cabelo ruim, cabelo duro que dizem por aí.
Me senti liberta, e pronta para fazer com que o mundo me conheça assim, como eu fui projetada por Deus.
Lembrando, que não sou contra quem alisa os cabelos, pois isso, seria um preconceito da minha parte, apenas quero que vejam que não é feio ser você, não é feio ter o cabelo diferente, volumoso, curto, enrolado, feio é não aceitarmos quem somos, feio é termos vergonha das nossas raízes...vivi por tanto tempo me escondendo e querendo ser uma negra-branca que hoje ao dizer tudo isso me sinto uma vencedora, não pelo fato de querer ser branca antes, mas pelo fato de ser negra, ter um blackinho, e me achar lindíssima como nunca.  Te desejo muito de você, independente de quem você é quando se olha no espelho, porque como já dizia o poeta, "o essencial é invisível aos olhos." Eu me encontrei em meio aos meus cachinhos e desejo que você se encontre com o cabelo liso, cacheado, black power ou sem cabelo algum, o importante é que você se sinta linda e única da sua maneira de ser.

Hoje quando olhei no espelho,uma surpresa! descobri as autênticas:

CARAMINHOLAS DE KAROLA :D

Um super beijo, até mais.


Referências: (Gênesis 9: 18 - 27, leiam com muita atenção ok?!)
- Livro: O Pequeno Príncipe - Antoine de Saint-Exupéry


6 Comentários

  1. Adorei!!! E você é linda independente do cabelo que escolha usar. A beleza não está no cabelo e sim em quem você é verdadeiramente! Beijos ;)

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  2. Encantada! Com o texto, com a atitude, com o cabelo. Ainda mais que para nós mulheres, o cabelo seja nosso ponto fraco, muito mais que celulite, estria... O importante é ser feliz e isso dá pra ver nos seus olhos. Ficou linda, amei.

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    1. Obrigada Juju, realmente cortar o cabelo me deixou muito feliz e livre :)

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  3. Uau!!! Lindo texto, cheio de você e cheio de sabedoria.
    È isso aí nós mulheres temos que nos aceitar da maneira que somos, nos sentir felizes com cabelo liso, enrolado, careca, gorda, magra, alta ou não....Essa é nossa verdadeira força, e precisamos ter consciência de que mesmo que não nos digam á todo momento que somos belas, sabemos o quanto o somos. E você Karol é uma dessas forças que nos impulsiona a ter esse olhar. Parabéns pela coragem, de ser, de pensar e de dividir isso tudo com a gente. Lindo!

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    1. Obrigada Mãe, tudo herdado da sua paixão por ler e escrever, foi o seu maior presente pra mim. te amo s2

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